Quem Entende com Dra Camila Magalhães

Precisamos cuidar da nossa saúde mental

* Por Dra. Camila Magalhães, psiquiatra e cofundadora da Caliandra Saúde Mental, empresa especializada em soluções de cuidados à saúde mental e treinamento de liderança

Antes mesmo da pandemia da COVID-19, dados provenientes do estudo São Paulo Megacity, realizado pelo Núcleo de Epidemiologia Psiquiátrica da USP, do qual faço parte, apontaram níveis preocupantes de ansiedade e depressão na população geral, trazendo à luz um amplo debate acerca dos fatores causadores da precarização da saúde mental do brasileiro.

Segundo o último relatório da OMS (Organização Mundial da Saúde), divulgado em novembro de 2022, com a pandemia, os casos de depressão tiveram um aumento de mais de 25% em todo o mundo, assim como houve um crescimento de 25,6% nos diagnósticos de transtornos de ansiedade. 

Este cenário trouxe ao mundo não só um olhar mais atencioso para as relações humanas, mas, também, para outras questões muito importantes. Entre elas, o alerta sobre a necessidade de cuidar da saúde de modo global, sem a velha dicotomia entre mente e corpo. Isso foi comprovado em diferentes estudos realizados em diversos países e é algo que eu, como psiquiatra há mais de 20 anos, posso afirmar com toda a certeza: nunca falamos tanto sobre saúde mental como nos últimos dois anos e nunca se percebeu tão claramente como a saúde mental, quando comprometida, leva ao aparecimento e ao prejuízo de outras doenças crônicas e inflamatórias, entre outras incapacitações. 

As análises registram que uma das justificativas para o aumento nos casos de depressão e ansiedade são fatores como estresse, inseguranças sobre o futuro, aumento da solidão deflagrada pelo isolamento social obrigatório e pelas restrições no contato com outras pessoas, além de medos, privações, prejuízos financeiros e mortes. 

A situação extrema que vivenciamos deixou muitas marcas, das mais diversas naturezas. No que diz respeito à saúde mental, cabe a nós cuidarmos para a conscientização deste tema e para ajudar quem precisa, pois, por mais que venha se falando mais a respeito, ainda há grande estigma e enorme reducionismo quanto as causas, atribuídos à manifestação dos transtornos mentais.

Quando falamos em saúde mental, não podemos limitar o assunto abordando apenas os transtornos mentais. Precisamos, também, conversar sobre o bem-estar psicológico, social e emocional de uma pessoa. Trata-se de algo que está intimamente relacionado à sociedade da qual fazemos parte, cuja expressão é permeada por aspectos socioeconômicos e pela enorme desigualdade em que vivemos. 

Complemento dizendo que, infelizmente, o sofrimento mental aparece sem hora marcada e pode se tornar um peso muito grande na vida de uma pessoa. Não é um tema fácil e possui inúmeras particularidades que darão contornos únicos para o modo como cada indivíduo vivencia esta experiência. 

Uma mente saudável depende do equilíbrio nas diversas áreas das vidas das pessoas, incluindo a forma como elas lidam com situações adversas, problemas, desafios, dificuldades, perdas e vitórias. Também gostaria de destacar que o mundo atravessa importantes transformações e nós precisamos mudar nossas atitudes em busca de melhorias. 

Por isso, querido(a) leitor(a), sempre observe os sinais que sua saúde mental dá quando precisa de atenção. Entre eles, o mais comum é a insônia ou aquele sono irregular que não te permite descansar e, consequentemente, mantém sua energia lá embaixo. Além disso, perder o apetite ou tê-lo em excesso também pode ser um sinal de alerta. Outros sintomas comuns são mau humor, tristeza, irritabilidade, falta de interesse em realizar atividades que gostava antes, dificuldade de concentração e raciocínio mais lento, fadiga, perda da libido, sensação de que não vai dar conta ou de que está muito mais difícil cumprir com atividades da vida diária. Alguns pacientes mencionam uma angústia difícil de ser combatida ou até mesmo dores ou sensações de mal-estar no corpo.   

Sendo assim, gostaria de sinalizar e destacar alguns hábitos importantíssimos para evitar esses sentimentos e aderir à moda de cuidar de si. Vamos lá!

O primeiro deles é praticar atividade física, afinal, cuidar do corpo é importante para a saúde como um todo. Casos mais leves de depressão, ansiedade, estresse e outros problemas podem ser superados com a prática de exercícios físicos constantes. Mas, é importante manter o equilíbrio e não tornar a prática um vício. Caso não possa fazer exercícios, saiba que caminhar por 30 minutos todos os dias é um grande estímulo para a produção de serotonina e de outros neurotransmissores do bem-estar e também contribui para a diminuição da inflamação e para o aumento da imunidade. 

Caso haja um diagnóstico de depressão, os exercícios ajudam no sono e na produção de endorfina, o que, a longo prazo, pode resultar na regeneração de alguns neurônios. 

A segunda dica é ficar de olho na alimentação. Estudos comprovam que uma alimentação saudável pode reduzir em até 16% o risco de depressão. Beber água também é importante, pois hidrata todos os órgãos do corpo, melhorando o funcionamento do cérebro. 

O terceiro ponto importante é dormir bem. Afinal, a privação do sono acaba resultando em irritação e exaustão. Além disso, gera estresse, ansiedade e até mesmo alguns agravantes, como problemas cardíacos e depressão. Por isso, é importante facilitar o sono, evitando alguns hábitos antes de dormir, como a ingestão de cafeína e assistir televisão ou mexer no celular. Ter um horário fixo para dormir também é benéfico nesse processo.  

A quarta dica é procurar adotar hábitos que favoreçam certo relaxamento durante o dia, mesmo que sejam pequenas pausas para dar uma “esticada” durante o expediente ou a rotina em casa, que muitas vezes é exaustiva. Nas pausas, respire e aprenda técnicas de mindfulness, que ajudarão imensamente no enfrentamento do estresse.

O quinto ponto é se valorizar. Dar valor a você não é o mesmo que ser individualista, é focar nas qualidades, admitindo até mesmo os defeitos e pensando em como superá-los, sem aquela cobrança absurda, mas, sim, indo aos poucos, reconhecendo as pequenas mudanças, conquistas e melhorias do dia a dia que te tornam uma pessoa mais leve e feliz.

Sexto: cuidado com os modismos e a indústria do bem-estar. Muitos se aproveitam do tema para vender conteúdos e cuidado sem ter formação adequada sobre o assunto. Busque informações de qualidade para diminuir o estigma, não espere que sintomas emocionais desagradáveis fiquem cada vez mais frequentes a ponto de prejudicar diversas áreas da sua vida.

O sétimo conselho é ter sonhos, metas e objetivos na vida. A busca por um ideal é o que irá motivar sua mente e seu corpo a trabalharem. 

E por último, o mais importante: se não conseguir, não tenha medo de pedir ajuda. Busque um amigo, um familiar, o cônjuge ou um colega de trabalho para conversar. Uma coisa é certa: se cuidar nunca sai de moda.

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