Papo de Balcão #6

Se me pedissem para imaginar o futuro dos restaurantes, certamente o Da Quebrada estaria entre os primeiros exemplos do que penso ser a direção que o mercado da gastronomia e alimentação deveria estar tomando. Para quem vê de fora, pode parecer só mais um restaurante vegano da Vila Madalena, mas a verdade é que o restaurante escola do Gastronomia Periférica é uma verdadeira aula de sustentabilidade, economia circular e de como implementar projetos sociais de impacto. Comandado e organizado pelas próprias alunas da escola de gastronomia, com apoio e patrocínio da marca de produtos naturais Mãe Terra, o Da Quebrada serve pratos 100% veganos e feitos com aproveitamento total dos alimentos que são todos orgânicos e provenientes de pequenos produtores locais - por lá, nada é jogado fora, nem cascas, nem talos ou sementes. Daqueles lugares que vale a pena conhecer. Confira a seguir o nosso bate-papo com a Alicia, uma das mulheres à frente da cozinha vegetal e consciente do Da Quebrada:

1. O Da Quebrada é o restaurante escola do Gastronomia Periférica. Explica pra gente como funciona? Como vocês se diferenciam dos restaurantes 'comuns'?

Alunes que passaram pelos cursos de cozinha profissional e de cozinha-empreendedorismo são quem protagonizam o Restaurante Da Quebrada, inclusive aquelas que têm seus próprios negócios. A ideia é que as pessoas ganhem experiência para colocar em prática aquilo que querem criar no formato de negócio de gastronomia ou para trabalhar em outras áreas no futuro. 

No Da Quebrada, nosso principal diferencial em relação a outros restaurantes é o veganismo e o uso total dos alimentos, que são todos orgânicos. Além disso, toda a operação é organizada por mulheres pretas da periferia, então sempre pensamos nossas ações de forma que o fluxo aconteça da melhor maneira possível, de nós para nós.

O protagonismo é quem impera, desde os vegetais e as marcas, até os fornecedores e as pessoas que trabalham aqui, tudo mostra como uma comunidade unida e forte também fortalece causas quase esquecidas por grande parte da população. O próprio fato de estarmos iniciando esse novo modelo de negócio e aprendendo a nos fortalecer e empreender para construir experiências na nossa vida cotidiana é o que faz com que cada dia mais tenhamos curiosidade de tentar novas maneiras de conhecer e saborear alimentos e histórias.

 

2. Para quem ainda não conhece o restaurante, o que podemos esperar? Quais pratos recomendam para a primeira visita?

Para se familiarizar com a nossa comida tem que estar aberto a experimentar. Para começar, eu super recomendo a Tostada que é um dos nossos pratos do café da manhã - ela vem com um pão de fermentação natural da Sapadaria, legumes grelhados e uma pasta de legumes. Combina muito com o nosso café que, inclusive, faz parte de outro projeto social, o Ubuntu Café, do Ronaro Soares, onde se formam novos baristas. No almoço, a dica é provar o PF, que é super completo. Sabe aquele feijão com gosto de casa de vó? É sucesso garantido para a hora do almoço.

 

3. Nesta edição, estamos falando sobre criatividade. Conta pra gente um pouquinho de como funciona a criação do cardápio de vocês? De onde vem a inspiração?

A criação de cardápio acontece a partir da criatividade das alunas, e falamos muito sobre o uso total dos alimentos e da sazonalidade de cada um deles. Então, sempre pedimos a lista do produtor e fazemos o cardápio em cima do que há disponível. Nos reunimos todas as sextas-feiras para trazer ideias sobre o alimento no qual queremos nos aprofundar e que podem ser adaptadas para o uso total do alimento dentro do veganismo. Acredito que a inspiração vem das vivências de cada uma e também da coragem de fazer parte de uma iniciativa que consegue visualizar a melhoria do meio ambiente.

 

4. Mais que um restaurante, o Da Quebrada é um belo exemplo de trabalho social e de consciência nas mais diversas formas. Fala mais pra gente sobre essa 'operação do bem' desenvolvida por vocês? 

Desde sua criação, o restaurante pensa nos produtos que são vendidos na lojinha e nas pessoas que fazem tudo funcionar, desde os fornecedores de alimentos orgânicos até as artistas e cozinheiras, que são todas da periferia. O projeto nos oportuniza sair do fundo e da posição de serviço para nos tornarmos protagonistas no contexto geral de um negócio de cunho social da Gastronomia Periférica. 

Trazer microempreendedores periféricos fortalece as alunas que também estão começando suas vendas, ao criar novos olhares de si e do outro. Isso sem contar que é um restaurante totalmente vegano sem nada de origem animal. Além disso, trabalhamos com produtos de pequenos produtores de Parelheiros, na Zona Sul de São Paulo - tudo o que compramos é utilizado em sua totalidade, incluindo cascas e sementes, aproveitando assim todos os benefícios e nutrientes dos alimentos e o resíduo que sobra. 

Já as sobras dos pratos vão para a compostagem que temos no fundo do restaurante e o adubo natural que é gerado é encaminhado para os produtores como forma de fortalecer o novo alimento que está sendo plantado. Assim, as causas do Da Quebrada se apoiam e fazem um círculo completo, e isso é o que faz o fluxo dar certo.

5. Em um Brasil que ainda passa fome, vemos uma quantidade enorme de alimentos sendo desperdiçados. Que sugestões vocês dariam para mudar esse cenário? Que medidas os restaurantes tradicionais podem tomar para pelo menos diminuir esse impacto?

De fato existe uma quantidade enorme de alimentos sendo dispensada que, muitas vezes as pessoas mal olham ou param para entender que aquilo que elas jogam fora é comida de alta qualidade. Aquela casca de banana que você joga fora, por exemplo, no nosso restaurante é protagonista de algum prato.

Quem desperdiça em abundância normalmente são os próprios restaurantes e as pessoas de alto poder aquisitivo, a mudança não é suprida através da falta, porque quem tem fome faz a comida render cozinhando até sopa de osso. No Da Quebrada, nós ensinamos aos nossos clientes que existem possibilidades para um mesmo insumo que ele nem imaginava. Logo, ele sai sabendo que uma casca de melancia pode se tornar picles para saladas e tem muito mais uso do que teria se fosse pro lixo. 

Isso sem contar que ele sai do restaurante entendendo também que pode economizar dinheiro, porque quando utilizamos totalmente o alimento, diminuímos os custos, e isso gera acessibilidade. O nosso restaurante trabalha a formação de pessoas que estão interessadas no processo e também contribui socialmente. 

Para diminuir o impacto do desperdício, é preciso priorizar as causas sem olhar a quem, começando a fazer o que gera saúde financeira para as pessoas, empreendimentos e para os bairros de São Paulo. O nosso projeto começou na Vila Madalena, com o trabalho e a consciência de muitas trabalhadoras da periferia que resistem até hoje contra o que é considerado normal.

 

Receita

PIMENTA CAMBUCI RECHEADA COM ALHO PORÓ AO MOLHO DE TOMATE COM FAROFA DE TAPIOCA FLOCADA

PIMENTA

Ingredientes

10 unidades de pimenta cambuci

200g de alho poró

1g de pimenta do reino moída

75g de cebola

50ml de água

6g de sal

modo de preparo

Tire todas as sementes das pimentinhas. Pique o alho poró e a cebola e misture com as sementes. Recheie as pimentas com essa mistura e coloque para assar por cerca de 15 min, a 160°C.

FAROFA DE TAPIOCA FLOCADA

Ingredientes

200g de tapioca flocada

5g de azeite

10g de cebola

5g de alho

1g de orégano

modo de preparo

Em uma frigideira, acrescente o azeite e a cebola, mexa até dourar. Em seguida, adicione o alho, a tapioca flocada e o orégano e misture em fogo baixo por cerca de cinco minutos, ou até ficar levemente dourada e crocante.

MOLHO DE TOMATE
300g de tomate italiano

50g de cebola branca

50g de cebola roxa

20g de pimentão

5g de alecrim

5g de tomilho

5g de manjericão

10g de alho

10g de sal

1g de pimenta do reino


modo de preparo

Corte grosseiramente os tomates, cebolas e pimentão e coloque no forno por cerca de 20 a 30 minutos para acentuar o sabor. Depois, bata os ingredientes no liquidificador e coloque em uma panela em fogo baixo para apurar, por cerca de 40 minutos. 

Pronto! Agora é só montar o prato com a farofa, a pimenta e o molho. Bom apetite!

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